a dor de dente é sempre menor na boca alheia.

eu fico com essa impressão de que os dias carregam um compilado de emoções, como sanduiches especiais do dia, sabe?

domingo é sempre down e melancólico, tudo colabora pra gente sentir saudade, mas em algum momento há nem que seja um fragmento de disposição pra que eu pense no compilado sentimental da minha semana emocionada.

em algum momento da nossa vida sinto que emoção e dor acabam dando as mãos e caminham pra algum lugar, as vezes em busca de restauração, as vezes numa triste noite em que as dores se reúnem, num bar qualquer. ou apenas andam por ai, mesmo que não se conheçam profundamente — a dor tentando ser a mais influente.

e faz um certo sentido, quando eu era criança de todos os medos que eu alimentava o que mais me assombrava era perder um dente e tudo isso aconteceu quando eu descobri que eles só nos davam uma chance e depois não cresciam mais. Acabei associando dor de dente a infância e já adulto eu acabei percebendo que algumas dores passam a não ter mais espaços nas nossas emoções.

os amores são anestesias, curativos, remédios, compressas, paliativos, band-aid… algo que paralise a dor que agora não é mais no dente e que só sabe quem sente.

lembro que depois de uma extração (que também é uma perda), a gente ainda fica meio dormente. esperando a anestesia passar pra sentir a dor real e esperar de novo até que ela passe. nenhum conselho que me deram acelerou a cicatrização, parecia que em mim o funcionamento era outro.

e como que a gente ousa em mediar a dor do outro, essa confusão que faz a gente acreditar que empatia é empatar o processo do outro e agir como se fossemos nós o centro do processo dos outros.

São outras bocas além da nossa.

tem dente que a gente escolhe tirar, outros precisam ser arrancados, alguns chegam em pontos de nos machucar. mas olhando pra boca dos outros a gente não entende o funcionamento delas, o que dói? você suporta o quente e o frio dos alimentos?

preciso acreditar que, como em uma extração, a dor e a emoção lá do começo agora não andam mais juntas.

um rompimento necessário. que acompanha a percepção do processo de cicatrização, extenso e relativo. que dores parecidas levam dias e anos para serem curadas. é tudo coisa de organismo ou do dia da semana.